Quero asas
Quero asas,
Quero sonhos,
Não mais pesadelos,
Pesadelos medonhos
Quero asas
Asas fortes para voar alto
Asas próprias
Para sumir num salto
Não há um destino aqui
Não posso mais sentir
Não posso voar
Posso mentir
Posso iludir, posso enganar
A mim e a você
Posso pensar – imaginar
Mas não posso ser
Não quero ser
Quero ter,
Quero asas para voar
Quero ir onde não posso estar
Quero isso,
E quero rápido
Quero o tudo e o nada
Quero fácil, quero ácido
Eu tenho cá para mim
Que para o tédio
Que me consome, agora
Não há remédio
Não há solução
À questão, essa tal
Indecisão, ser não ou não ser
Viver o prazer mortal
Não vejo
Seria eu cego?
Ou seria tu deus?
Eu nego, eu nego!
Sei contar,
Sei comprar
Mas quero asas já
Quero o que posso lá
O aqui me empobrece
O que me atrai
É tranqüilo dizer...
Ele trai
Você sabe, eu sei,
Ele... Ele quem?
Não se sabe o que é
Se é algo ou alguém
Não há vestígios
D’onde vem
O que quer
Se para lá ou vai aquém
Preciso das asas
Preciso de ti – Cá!
Quem és tu?
Meu português não sabe conjugar
Vestígios fugazes, errantes
Guerreiros cantantes
Entendes tu?
Então estaria meu corpo nu?
Ah, deixem me voar
Deixem-me ao léu
Quero um sonho sublime
Deitem-me no véu
Do desprazer ou do ser
Do fazer ou do abismo
Não importa para que
Quero o sentimento, o cinismo
O intenso
O vil, o puro, o podre
O forte
O áspero, o frio, o nobre
Quero-te
Quero asas, quero-as em mim
Quero sim, assim,
Enfim, triste fim
Triste caminho
Conforto ao ninho
Sou uma ave estranha
Infecto nas entranhas
Não consigo
Tirar os pés do chão
O consolo me contrai
O eterno me é vão
Tudo em si
É vazio e trêmulo
Embaçado, nebuloso
Nada se desvela no embolo
O apego logo cativa-se
Por qualquer olhar manso
Deito em colo estranho
Em busca dum simples descanso
Eu vou,
Isso vem, eles vêem
Quem liga, quem importa
Quem nada tem?
Não, não, não
O que? Assim então
Eu faço, você revida
Assim então é a vida?
Ah, impaciência de subir
Impotência
Ânsia de fugir
Intolerância, relutância, dureza
Fraco e frágil
Mais um passo
Um novo traço
No estágio, lasso
Esbarro, escarro o barro – Um sarro!
O jarro, varro e narro – Um sarro! ¬
O Escarro, no jarro de barro ao forro
Eu morro e não vôo, não sôo, não suo
Não sou o sol, o céu, Ah o mel
Do beijo!
Quero voar com asas pra lá, pra aqui, pra acolá
Não sei a rima, não sei o passo, não sei o caso, o amasso
Eu faço e faço, por traço
Quero asas
Pro sonho, o sonho de estar
O sonho de cantar
O gorjear do regozijo
Aflijo a mim e “amém!” dizem eles
Quero asas
Para sobrepujar
O pesadelo de ficar,
É este ensejo para atar
O louco que me torno
Por mais querer
E quanto pior me conformo
Mais sinto os cordões apertarem mais meus braços que agora se laçam em minhas costas, mas ainda assim, de joelhos, quero asas!
– Asas para voar!