Punir sem vitimar
Pusemos fim ao espetáculo do suplício
e então nasceu a Modernidade
Nasceu com ela também a prisão e a fábrica e a propriedade privada e o capital
Nos críamos mais humanos, então,
por criarmos esse mundo diferente do suplício cristão,
em que o corpo deveria padecer até expiar os males
– eis a economia da extorsão dos pecados pela dor
E, mais humanos, passamos a dizer e repetir
até crer e sentir que a morte é pior que o sofrimento,
que morrer derradeiramente é indesejável e imperdoável,
enquanto sofrer
– essa pequena morte cotidiana que não mata,
mas lesa corpo e alma –
dia após dia,
noite mal dormida após noite mal dormida,
é santidade
– eis então a Modernidade
E criamos a escola e a fé e o espetáculo e o amor e a família e o abstrato,
para que creiamos,
dia mal vivido após dia mal vivido,
noite após noite,
no mantra cotidiano:
viver é melhor que findar
ou
vale a pena seguir sofrendo sem paraíso terreno a pôr fim à dor,
ou
a vida em miséria é desejável à morte – esse pecado mortal –
ou
sofre alegre pela dádiva e não arrisca tua própria vida por uma vida mais digna
Nenhum comentário:
Postar um comentário