segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Em uma sala acolchoada bafejo...

Quero asas

Quero asas,
Quero sonhos,
Não mais pesadelos,
Pesadelos medonhos

Quero asas
Asas fortes para voar alto
Asas próprias
Para sumir num salto

Não há um destino aqui
Não posso mais sentir
Não posso voar
Posso mentir

Posso iludir, posso enganar
A mim e a você
Posso pensar – imaginar
Mas não posso ser

Não quero ser
Quero ter,
Quero asas para voar
Quero ir onde não posso estar

Quero isso,
E quero rápido
Quero o tudo e o nada
Quero fácil, quero ácido

Eu tenho cá para mim
Que para o tédio
Que me consome, agora
Não há remédio

Não há solução
À questão, essa tal
Indecisão, ser não ou não ser
Viver o prazer mortal

Não vejo
Seria eu cego?
Ou seria tu deus?
Eu nego, eu nego!


Sei contar,
Sei comprar
Mas quero asas já
Quero o que posso lá

O aqui me empobrece
O que me atrai
É tranqüilo dizer...
Ele trai

Você sabe, eu sei,
Ele... Ele quem?
Não se sabe o que é
Se é algo ou alguém

Não há vestígios
D’onde vem
O que quer
Se para lá ou vai aquém

Preciso das asas
Preciso de ti – Cá!
Quem és tu?
Meu português não sabe conjugar

Vestígios fugazes, errantes
Guerreiros cantantes
Entendes tu?
Então estaria meu corpo nu?

Ah, deixem me voar
Deixem-me ao léu
Quero um sonho sublime
Deitem-me no véu

Do desprazer ou do ser
Do fazer ou do abismo
Não importa para que
Quero o sentimento, o cinismo

O intenso
O vil, o puro, o podre
O forte
O áspero, o frio, o nobre

Quero-te
Quero asas, quero-as em mim
Quero sim, assim,
Enfim, triste fim

Triste caminho
Conforto ao ninho
Sou uma ave estranha
Infecto nas entranhas

Não consigo
Tirar os pés do chão
O consolo me contrai
O eterno me é vão

Tudo em si
É vazio e trêmulo
Embaçado, nebuloso
Nada se desvela no embolo

O apego logo cativa-se
Por qualquer olhar manso
Deito em colo estranho
Em busca dum simples descanso

Eu vou,
Isso vem, eles vêem
Quem liga, quem importa
Quem nada tem?

Não, não, não
O que? Assim então
Eu faço, você revida
Assim então é a vida?

Ah, impaciência de subir
Impotência
Ânsia de fugir
Intolerância, relutância, dureza

Fraco e frágil
Mais um passo
Um novo traço
No estágio, lasso

Esbarro, escarro o barro – Um sarro!
O jarro, varro e narro – Um sarro! ¬
O Escarro, no jarro de barro ao forro

Eu morro e não vôo, não sôo, não suo
Não sou o sol, o céu, Ah o mel
Do beijo!

Quero voar com asas pra lá, pra aqui, pra acolá
Não sei a rima, não sei o passo, não sei o caso, o amasso
Eu faço e faço, por traço
Quero asas
Pro sonho, o sonho de estar
O sonho de cantar
O gorjear do regozijo
Aflijo a mim e “amém!” dizem eles

Quero asas
Para sobrepujar
O pesadelo de ficar,
É este ensejo para atar
O louco que me torno
Por mais querer
E quanto pior me conformo
Mais sinto os cordões apertarem mais meus braços que agora se laçam em minhas costas, mas ainda assim, de joelhos, quero asas!
– Asas para voar!


terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Que o verso enfoque...

O aprazer do toque

Posso eu tocar teus lábios mais uma vez,
Acariciá-los e sentir o veludo de suas curvas,
Contorná-los com minha língua, e tua altivez
Amimar junto com tuas volúpias e deixá-las parvas?

Posso ser eu quando, aos teus desejos, transijo
Mergulhando-te em deleite, ao êxtase, elevando-te
Pungindo teus sentidos a levar-te ao regozijo
De modo que o anelo pelo repetir, do teu peito, brote?

Perscruto-te suspirado, o que não te apraz?
Desvelo as ninfas que ocultas dos olhares fugazes
Desperto em ti outros anseios, que só o toque traz
Consegues resistir ao insurgir dos sentimentos vorazes?

Desfaleces ao tanger das carnes, voyer
A todo o prazer que circula em tuas veias ardentes?
Ouvirei ressoante de tua boca “rendre son tablier”
Por, relutante, não mais suportares os gozos torrentes?


[8]

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Em palavras vomitadas...

A Arte do Contra

Não quero a arte bela nem pura
Quero a arte má, a arte escura
A arte que espinha, que dedura
A Anti-buguesa, Anti-ditadura
A arte que assusta, ataca e fura
Essa é a arte da contracultura

Aquilo que desperta nojo nas pessoas
É o que me atrai.
Naquelas coisas rejeitadas, renegadas
É que eu vejo rima.
Naquilo que o todo mais quer esconder
É o que eu vejo a grima.
Aquilo que vem e não há como conter
O que trai! O que trai!

Não quero compor um verso reto
Nem poemas feitos de concreto
Sem o sentimento como mero objeto
Fazendo emergir o que há de abjeto
Pondo o que há de repulsivo ereto
Cutucando fundo o que parece quieto

Aquilo que é pejo às pessoas
É o que me atrai.
Às deusas do Olímpio banidas
É que eu faço rima.
Naquilo que a todos mais provoca opróbrio
É o que eu vejo a grima.
Aquilo que vem proibido ao sóbrio
O que trai! O que trai!